22 de março de 2009

el camino al caminar

Eu gostava de caminhar pelo Malecón. Gostava de ver aquela avenida beira-mar lindíssima meio abandonada, com seus prédios desbotados, querendo cair, mas sem muita motivação. Ali sentia-me verdadeiramente no passado, lá pelos fins dos anos 50, que foi quando o tempo parou em Cuba. Das janelas sem varandas, quase nenhum dos habitantes olhava, já sabidos e enjoados que estavam da paisagem que, apesar de divina, não enchia a barriga de ninguém.

A praia de La Habana não tinha areia. Somente pedras, o muro de contenção e a água azul-nervoso, se debatendo num desejo louco de arrastar aquelas construções decadentes para o fundo. A brisa não havia. Era um vento forte, um vento que descabelava tudo, principalmente nas temporadas ciclônicas, em que ele quase me levava pelos ares. Mas eu já levitava. Sentia o gosto de sal perfumado, o cheiro de mar de quando eu era criança, o olhar de filme antigo nos passos arrastados daquela gente que sorri.

Toda hora passava um calhambeque fazendo barulho ou um cadillac rabo-de-peixe soltando fumaça preta fedorenta que empesteava tudo. Os táxis Mercedes de luxo também, esses sim, sem deixar um rastro de ruído sequer. Silenciosos, abençoados com ar-condicionado, carregavam os endinheirados que se hospedavam no Habana Libre, se banhavam na Varadero paradisíaca, zanzavam pela linda Habana Vieja, dançavam salsa na Tropicana e depois de dez dias no país voltavam pra casa achando que o comunismo deu certo.

Nos fins-de-semana, aquele passeio público se enchia de namorados. Dezenas de trios de músicos percorriam o caminho com violão, flautinha e bongô – os instrumentos variavam –, e se agarravam aos turistas e aos amantes, esperando ganhar uns trocados. Cantavam sempre as mesmas músicas românticas que, um dia, apesar de gostar delas, cansei de ouvir. “Esto no puede ser no más que una canción... Quisiera fuera una declaración de amor... Romántica, sin reparar en formas tales... Que pongan freno a lo que siento ahora a raudales... Te amo, te amo, eternamente, te amo...”

Tenho saudades das tardes de sol no Malecón em Havana.

Um comentário:

Silvio Garcia Martins Filho disse...

De repente me deu uma vontade louca de ir pra Havana!

Adoro seus textos! Não sei pq me fez lembrar do calor do sol no inverno uruguaio caminhando na Rambla, totalmente desconhecido e alijado pelo idioma que mal conhecia. Talvez pq tb sejam excelentes memórias. :)